MÃE-GALINHA



2005-09-20

Escrito há tempos #1

18/4/2005
Anda uma chata para comer e quase sempre tem havido lágrimas à mesa. Até adoptamos um novo ditado: “não há sábado sem sol, nem domingo sem missa nem jantar sem as lágrimas da Inês”.
Ontem não foi excepção, apesar do opulência da lasanha,. Admito que estava exausta, um fim de semana de chuva tem destas coisas, deixa-me de rastos e chego um ponto em que já não as posso ouvir. Íamos portanto na fase do “abre-me-essa-boca-senão-vou-ter-que-me-chatear!”. E ela nada. Abriu a boca mas caiu-lhe metade da sopa pelo queixo abaixo. Ao fim de umas quantas ameaças lá comeu e seguiu-se a lasanha. “Quantas garfadas tenho que comer?”
- Todas! – respondi
- Mil?
- Não, para aí umas cem – respondi (para exagero, meio exagero basta)
- Cento-mil? – perguntou ela com os olhos a chisparem raiva
- Que é isso?
- Então tu não sabes o que é cento-mil?
- Não… - disse eu na esperança que ela me falasse acerca de um número “muita” grande. Enganei-me. E começou o disparate mais imagintaivo que alguma vez me lembro de ter ouvido:
- Então, cento-mil é A palavra que AS pessoas dizem quando acordam.
- Quando acordam?!
- SIM! – gritou – quando acordam! E tu também tens que dizer. Se não disseres, Jesus castiga-te.
- Jesus??? (ai a minha vida…. Onde é que isto vai dar????) E castiga-me como? Atira-me um tijolo à cabeça?
- Não. Claro que não. Leva-te para o céu.
(pronto)
- Ai que horror!
Nesta altura o olhar do pai tinha passado de espantado a aterrorizado; perguntou:
- e como é que se vai para o céu?
- pode ser de escadote – disse ela muito despachada -chega-se lá a cima e sobe-se para uma nuvem.
Eu, nada contente com o desfecho daquela história, vendo-me morta e de alma a subir ao céu pelo simples facto de não ter dito cento-mil ao acordar, quis saber se a volta tinha retorno:
- olha… e quando se vai para o céu pode-se voltar?
- claro - traz-te o Jesus, agarrada pelos pés
(bela imagem – Jesus, de túnica e barbas, voa com uns propulsores nas costas e agarra-me pela parte mais feia de mim - os pés, para me devolver à vida terrena)

Ainda a história ía a meio, fiquei a saber quando fiz a inocente pergunta:
- Mas como é que tu sabes isso tudo?
- Porque eu sou amiga do Jesus. Então tu não sabes que fui eu que o ajudei a nascer?
- Ai sim?
- Sim.
- E que mais?
- Sou irmã dele. Mais velha.
- Ah… Não és minha filha?
- Não!
- Então és filha de quem?
- Do José. (pausa) E da Maria.
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© Rita Quintela
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