Minto-lhes às vezes, descaradamente, disfarçadamente, medrosamente. Conforme.
Exmino a minha consciência que não me pesa nada (e não minto, agora!) e sei que se lhes minto, às vezes, é para
lhes afagar as saudades
- Oh... não chores, o pai já vem (e ainda faltam uns quantos dias para que regresse)
ou para lhes acalmar o nervoso miudinho
- Vais ver que não custa nada! (e imagino-a no palco com quinhentos pares de olhos em cima e até transpiro)
ou, como tantas vezes, para as ameaçar
- Se não vais já tomar banho vou aí acima e já vais ver
( ultimamente tenho reduzido esta mentira porque noutro dia desmanchei-me a rir quando ouvi "
vou ver o quê?! os desenhos animados, é?")
Nunca lhes menti a respeito da dor. A mim a dor física impõe-me respeito e nunca lhes disse
- Oh... isso não dói nadaou
- Não! É só uma picadela e não custaou
- Vá, deixa de ser mariquinhasA mim a dor física incomoda-me tanto. Suporto-a bem mas arrepia-me.
Por isso é que me arrepio toda quando a Inês insiste:
- Mas eu quero mesmo furar as orelhas,
mesmo depois de eu lhe dizer que dói muito.
Arrepio-me tanto com a dor como com a coragem.