MÃE-GALINHA



2006-03-29

A casa azul

A loja cheirava sempre a café acabado de moer e tinha um balcão de madeira enorme, que formava um U. Cabiam muitos fregueses no balcão e eu lembro-me de ver a loja cheia.
Do lado direito do balcão havia uma parede feita de gavetas de madeira. Eram mais de sessenta gavetas! Estavam ordenadas por ordem alfabética e cada uma delas tinha uma etiqueta autocolante escrita em letra floreada: Alfinetes, ..., botões,..., colchetes,..., dedais,..., elástico fino, elástico grosso,..., fitas de cetim, fitas de nastro, fitas de seda, e por aí fora. Tudo! Havia tudo! Havia chitas lindas, quadrilês, pano de lençol e as mais fantásticas peças de bordado inglês.
No topo do U estava uma balança como esta mas de outra cor.
Na parede em frente à das gavetas havia prateleiras com ferramentas, cartuchos de caça e outras coisas de que já não me lembro.
Tanto tempo...
Interrogo-me onde estarão agora essas coisas que são também um bocadinho minhas.

Também havia cadernos, lápis, reduçados e chocolates.


Eu, quando era pequena, gostava de lá estar com os meus primos a brincar às lojas. Gostava de medir elástico com o metro de madeira e de fazer embrulhos com papel pardo.

A senhora Ermelinda, a quem chamávamos madrinha apesar de não ser madrinha de nenhum de nós, e o meu avô, eram os donos da loja.
A madrinha sempre foi muito velha e morreu algum tempo depois de terem transformado a loja num mini-mercado.

Há três meses fecharam as portas de vez.
Estes cadernos deu-mos há dias a minha prima Teresa, sem saber, se calhar, o que eles representam para mim.





Apesar de os ter fotografado em frente e verso, ainda não tive coragem de reler as histórias porque me vão saltar dos olhos as memórias e eu agora não quero.



Descomprimo:
A Rosa-Catita é ela, de certeza!, e teria gostado muito de conhecer a loja.
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© Rita Quintela
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