MÃE-GALINHA



2005-01-13

PORQUE É QUE AS MINHAS FILHAS SÓ VÃO AO CENTRO DE SAÚDE LEVAR VACINAS - UM POST PARA DESCOMPRIMIR

Ao fim de três anos e meio, foi-nos finalmente atribuida uma médica de família. Até aqui, sempre que precisávamos, recorríamo ao SAP ou ao chamado médico de reforço, que atendia exacatamente as famílias sem médico de família. Ou seja, um médico que nem sequer conhecia os doentes, quanto mais a história clínica e familiar.
Felizmente, somos pessoas saudáveis e tirando uma ou outra gripe mais persistente ou alguns achaques mal amanhaados do pai João, é raro termos que ir ao médico. Felizmente, sendo funcionária pública, tenho direito à ADSE pelo que recorro quase sempre a médicos particulares sendo depois reembolsado de parte do valor da consulta (dentista, oftalmologista e ginecologista). O pai João não tem ADSE mas também é menos dado a ir ao médico do que eu.

Finalmente, e concluíndo o prólogo, sempre que é absolutamente indispensável uma ida não programada ao médico, recorremos a uma clínica onde, pelo facto de sermos beneficiárias da ADSE (eu e as miúdas), pagamos apenas 4 €. O hospital está reservado a situações mesmo graves.

Uma carrada de sinusite que faz o favor de me fazer companhia desde Outubro levou-me amarcar uma consulta na médica de família. À hora marcada, lá estava. Conhecendo a casa, sentei-me e esperei. Observei. Duas ciganas bem vestidas mimavam uma bébé linda, sorridente, morena. Outras crianças na sala e um olhar para o placard confirmaram dia de saúde infantil. Do outro lado, um casal de velhotes a dormir. Uma rapariga de olhar parado, com as mãos uma sobre a outra e, em frente a mim, um ser assexuado escreve, como eu, num caderno. É homem, reparo mais tarde. Há ainda uma mãe com um filho adolescente que conversam sobre banalidades. Chega uma senhora gorda, conhecida desta mãe e eis que surge a pérola da minha tarde de espera: A mulher fala, fala, fala e não se cala, com a história do sangue grosso e das anestesias e as máquinas a que esteve ligada e outra vez o sangue muito grosso que lhe corre nas veias. O coração muito fraquinho não a impede de continuar a falar quase sem respirar. E desfia o rol de queixas:
- Que eu só aqui venho buscar as receitas e as credenciais. Sim, porque se fosse o doutor não-sei-quantos eu já cá não estava, derivado à grossura do sangue já havia de me ter entupido as veias todas!
Levanto-me. Pergunto se demora muito. Não sabem:
- A doutora atrasa muito as consultas...
Sento-me. Continuam a chegar pessoas, qual delas a mais estranha.
Aqui espera-se e desespera-se.
Quando sou finalmente chamada, já nem me lembro ao que venho... Ah! As dores de cabeça e a ranhoca.
- Ora vamos fazer aí um tac ao nariz (senhora doutora, não é UM tac, é UMA tac) mas, pelo sim pelo não, marcha uma caixinha de antibiótico!
- (Isso pensas tu) - digo para os meus botões (Faço a tac e depois logo se vê)
Mais umas vitaminas e uma vacina em gotas (intragável, por sinal).
No fim, três horas de centro de saúde e hei-de ter que cá voltar para mostar o exame.

Não é que na pediatra não espere, às vezes horas. Mas não tenho que gramar com os queixumes do povo nem com médicos do despacha. É por isso que pago, e bem. Três crianças vezes cinquenta e cinco euros, algumas vezes por ano, dá uma continha razoável.

Conclusão: É com muito gosto que não introduzo as minhas filhas na arte da sobrevivência ao sistema público de saúde.
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© Rita Quintela
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